sexta-feira, 26 de junho de 2009

Uma história de amor de verdade


Uma historia de amor de verdade é assim:

Dia 1: Ela olha pra ele, tenta disfarçar, mas passa um olhar não tão discreto pelo seu corpo, sua estrutura. Primeiro nos olhos e nas mãos, na seqüência observa os sapatos, a camisa, ouve o timbre da voz, sente o perfume, ouve atentamente os comentários, sente um traço de romantismo (o que traz alguma segurança), então permite alguma troca de comunicação que se inicia numa canção que juntos resolvem cantar.

Dia 2: Muita ansiedade, afinal a noite foi extraordinária. Vão ao cinema, filme nacional, riem e se emocionam com a história na grande tela, mas com as pupilas dilatadas olham profundamente um no olho do outro e em meio aos diálogos em surround, surgem beijos delicados e vez ou outra mais audaciosos. Decidem definitivamente abraçar a paixão. Nada sabem um do outro, apenas que se sentem muito bem respirando o ar entorno.

Um mês: É amor. Ponto Final.

E de tempos em tempos, como de costume algo de suas personalidades se apresenta como grandes animais pré-históricos aterrorizantes. Ela fala demais, ele é intolerante. Ela usa decotes, ele se irrita. Ela... Ele... Mas ai, quanto amor... Amor dói te avisaram? Avisaram sim. Aos dois. A vida não deixou passar despercebida tal incômodo, a da dor de amor. Mas amor também insiste, teima, dilacera o soldado que por puro amor a pátria, sem saber qual exata é a causa da guerra, desfalece em exaustão.

Na vida romântica haveria uma traição, muita lágrimas, um adeus. Mas não foi bem assim o final do ato primeiro desta história. O que houve foram berros, empurrões, palavras enormes, palavrões daqueles pesados, tempestade, ira, descontrole, cenas de tirar o fôlego dos vizinhos e apavorar os amigos que escutam a narrativa, independentemente do narrador e de sua versão.

Bem, como se trata de uma história de amor, tudo pode acontecer, senão não seria uma história de amor, mas um conto de fadas e, contos de fadas, são para fadas, príncipes e princesas, não para gente de corpo, alma e sentimento, especialmente sentimento. Depois de passado o entreato, composto de outras experiências para ambos os lados, nem perto de amorosas, apenas casuais, com direito a melodrama, tragicomédia e tragédia na mais absoluta e fidedigna interpretação, vem ela, a famigerada, aquela que dói mais que o amor: A SAUDADE. E cai. Cai lágrima, cai pressão arterial, cai o mundo, cai o desespero. Supõe-se nessa altura dos acontecimentos que nenhum deles tomaria uma atitude, mas como era de se esperar, a sorte apontou para ele e foi ela quem telefonou.

O reencontro deu-se primeiro na cama. Entre orgasmos e choro, a saudade consumou o ato. Um adeus, até breve, tudo incerto, nada nas mãos. Depois, o acaso permitiu uma segunda vez, num bar dançante. Ela estava simples, meio sorriso no rosto, o coração aos pulos. Ele lindo, cabelos prateados, ainda mais charmoso. Dilúvio. Dilúvio...

Tudo poderia acabar como na quarta feira de cinzas quando ela logo se lembrou que amá-lo era como carnaval e rapidamente sem fantasia, nem maquiagem, desceu aos seus pés com a humildade de uma santa e entrega-lhe sua alma cansada da saudade, pede a remissão, pede o abraço e se mostra vencida da inútil tarefa de desistir de amá-lo.

Ninguém sabe ao certo o final da história, mas como é uma história de amor, imaginamos finais felizes, com bolhas de sabão, chuva de arroz, caminhão de mudança, cruzeiro no Atlântico, talvez Pacífico, maternidade, batizado... Uma lareira, alguns netos, um cão... Duas mãos, a dele sobre a dela... Ou a outra opção: caminhão de mudança, viagem pela Europa, ou alguma Chapada dentro do país, banho de champagne, sexo, sexo, sexo, sexo, alguns netos, sexo, sexo, sexo, uma gato persa, sexo, sexo, duas mãos, a dela sobre a dele (no caso deles a primeira opção é menos provável pois são muito lascivos...). Bem, como se trata de uma história de amor, tudo pode acontecer.

Um comentário:

  1. Lindo! Conseguiste criar uma cena tão intensa quanto o amor de verdade, com palavras. Simplesmente incrível!

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